Vivendo em mundo de aparências e subjetividades criadas pela nossa interpretação cerebral estamos constantemente sugestivos às falácias e sofismas mentais que nos inferem incivilizadamente toda forma de associação subconsciente do mundo que nos cerca. Assim surgem as bifurcações de pensamento que criam em nós a idéia do que e de quem é bom ou ruim. Estas sugestões fazem parte do próprio desenrolar da história, da necessidade de adaptação, dos instintos e da vivência. O homem acaba achando que quem fala manso é “bom” e quem é convicto é “ruim”. Quem é calmo é “bom”, quem é explosivo é “ruim”; e assim, acaba-se estereotipando-se de uma forma permissiva a questão do nerdismo.
Antes de tudo, é preciso entender o que é um nerd. A primeira estereotipação a ser tratada é esta. Se a pessoa é inteligente, tira notas boas na escola, manda bem no video-game, ganha sempre no War, usa óculos, gosta de Star Wars, já rotulam como “nerd”, o que a bem da verdade é um profundo desconhecimento da questão do nerdismo. O que define alguém como nerd não é o seu gosto, mas a incapacidade de adaptabilidade, versatilidade e interação, onde estas formas de comunhão social são deixadas de plano em favor de uma egóica busca por algo individual.
O nerd não se importa de não ter amigos para sair, ele se realiza mais jogando rpg online. A questão também não se finda nos termos de isolamento, haja vista que sempre há a opção de livre-arbítrio para cada um escolher o que faz da própria vida, porém, o nerd nasce a partir do ponto em que esta omissão do contato social é feita apenas para proveito próprio e por busca de coisas fantasiosas. O nerd não se importa de ser virgem aos 30 anos, desde que tenha o box da série de ficção científica em casa para assistir domingo à tarde. E, é por isto que o nerd sabe falar o idioma jedi, mas não sabe como falar com uma mulher.
Entendendo então o que é um nerd, passa-se a observar seu comportamento. Pela própria peculiaridade de sua natureza, o nerd é introspectivo, é quieto, é na sua, pois, se fosse extrovertido, seria ativo e buscaria maior inclusão social. Ninguém é extrovertido para si mesmo, a extroversão carece de um observador, as pessoas que querem parecer engraçadas precisam de alguém que as ache assim. O nerd, como introspectivo, é quieto, calmo, não é efusivo, é concentrado. Esta postura passa aos outros a idéia de que o nerd é uma boa pessoa, pois está enraizado em seu subconsciente a idéia de que o silêncio é paz e o barulho é guerra. Instinto animal puro e simples.
A questão da inteligência avançada dá ao nerd um respeito social pré-concebido. O grupo vê, no subconsciente, a inteligência do nerd como um potencial útil a estar potencialmente disponível para si. Quando Weber disse que “o trabalho dignifica o homem”, nada mais ele representou que este desejo subconsciente do rebanho proteger o cordeiro que lhe é útil, e o nerd é útil com sua inteligência e afinco. Da mesma forma que chegou-se a enraizar no inconsciente coletivo uma idéia negativa sobre os ciganos. Ora, ciganos não são economicamente ativos, não trabalham em empresas, logo, não pagam impostos.
Pelo abordado, tem-se que os nerds acabam adquirindo até uma certa boa visão pela maioria da população. Por serem inteligentes e quietos, acabam passando uma boa imagem, de alguém “bom”, “humilde”, inteligente e útil; entretanto, tal visão pode muitas vezes ser equivocada, na medida que esta é apenas uma amostragem superficial da fantasia dos nerds que usam uma máscara que lhes foi dada, por nós mesmos, para maquearem quem realmente são. Para os outros, são “bons”, “educados” e “humildes”, mas em seu oculto, em certas situações, revelam o que tem de pior como ser andante das águas desta vida.
Um dos elementos mais nítidos no nerdismo é a razão exacerbada. A razão que não tem outra forma de agir a não ser em fórmulas mecânicas de pensamento e agir. A razão que não dá espaço ao coração, à intuição e à consciência. O 9 de Espadas do Tarot, a “crueldade” representado por Marte em Gêmeos, a ação do intelecto desprovida de sentimento, as pessoas que agindo pela razão não sabem o que é perdoar. Assim nasce uma crueldade em muitos nerds, que cegos pela razão não conseguem enxergar o que há além disto. Na vida nos deparamos por situações em que temos o livre-arbítrio para poder fazer algo que pode magoar o outro e às vezes as pessoas escolhem fazer isso, porque não sentem e não intuem. Uma palavra, um gesto, uma omissão, que aos olhos da sociedade não é reprovado, mas que pode magoar o outro, muitas vezes é cometido por nerds que não conseguem sentir isso. É o domínio da razão sobre o coração, a razão que vive em sofismas e falácias mentais.
O nerd, como ser racional que é, utiliza manuais morais e legais para orientar suas atitudes. Quando age, é sempre pensando no que é certo pelo conceito de justiça da sociedade comum. Quem tem um amigo nerd sabe como é. Às vezes quando você sai com amigos é natural que uma vez um ou outro esteja sem dinheiro, porém, como vocês são amigos e o que vale é a companhia da pessoa, o dinheiro é o de menos. R$ 1,00 a mais ou R$ 1,00 a menos não seriam nada pela alegria de estarem juntos, comungando. Porém, os nerds não conseguem pensar assim, apenas pensam: “custa tanto, vamos dividir igual, eu só pago a minha parte”, pois não existe lei ou norma social que obrigue alguém a objetivar o coletivo ao invés do individual. Esta questão exemplifica o porque do próprio conceito de nerd constar o indivíduo que não consegue interação social. Entre amigos há pactos de amizade onde se repudia mesquinharia. Deixar de ter um bom momento entre amigos por causa de centavos parece inacreditável, mas há nerds que não vêem assim.
O lado obscuro dos nerds surge quando o indivíduo cego pela razão não consegue mais ver o que está além de fórmulas e morais sociais, não consegue sentir, perceber, não pratica a empatia justamente por ser um indivíduo solitário, fechou-se em seu mundo próprio de fantasias e ficções, não consegue tolerar o outro porque não convive com o outro, não sabe como o outro se sente porque abdica do convívio social para viver irrealidades, o lado obscuro se manifesta na incapacidade de perdoar, de objetivar o grupo, de entender a coletividade, de deixar de ser mesquinho, de entender que quando amigos estão em uma roda ele pode beber a Coca-Cola dele enquanto os outros bebem cerveja e que se ele ganha R$ 2.000,00 por mês em uma empresa não vai lhe fazer falta R$ 0,50 para ajudar na conta do grupo, e que não há dinheiro no mundo que pague a boa convivência entre amigos, que estes R$ 0,50 podem lhe custar a amizade de amigos que não toleram mesquinharia e individualidades exacerbadas no grupo, que amigos se ajudam mesmo que a fórmula matemática divida igualmente, que as pessoas precisam mais de compreensão do que uma análise fria e simples baseadas em logaritmos de relacionamentos.
As aparências enganam e é preciso cuidar para não ser enganado com esta aparência frágil, calma e serena, pois por muitas vezes por trás de uma imagem assim é que se esconde uma pessoa fria, calculista, sem capacidade de percepção e intuição e que não sentirá pena alguma em fazer o que está programado para fazer. Da mesma forma que não devemos criar pré-conceitos negativos sobre as pessoas, não devemos criar os positivos, achando que só porque alguém tem tal imagem é uma pessoa boa somente por isto.
Comments